A sagrada tradição apostólica da Igreja
Um dos pilares sobre os quais se assenta a fé da Igreja Católica é a Sagrada Tradição Apostólica. Esta Tradição, chamada pela Igreja de Sagrada, é tudo aquilo que ela recebeu dos Apóstolos e que a eles foi confiado diretamente pelo próprio Jesus Cristo. Não se trata da tradição dos homens, mas somente daquilo que se refere à salvação das almas, e que nos foi deixado pelo Senhor.
Sabemos que o Magistério da Igreja extrai todo o ensinamento que dá aos fiéis, da Revelação Divina, que se compõe da Tradição oral (que veio dos Apóstolos) e da Tradição escrita (a Bíblia). É sobre essa Tradição (escrita e oral), com igual importância nas duas formas, que o Magistério assenta seus ensinamentos infalíveis.
Portanto, a Igreja católica não se guia apenas pela Bíblia (a Revelação escrita), mas também pela Revelação oral que chegou até nós. Sem esta última, nem mesmo a Bíblia existiria como a temos hoje, já que ela foi "berçada", como diz D. Estevão Bettencourt, e redigida pela Igreja.
A transmissão do Evangelho, feita pelos Apóstolos, fez-se de duas maneiras: oralmente e, depois, por escrito, cerca de 20 anos após a morte de Jesus.
No ensino oral os Apóstolos transmitiram aquelas coisas que ou receberam das palavras, da convivência e das obras de Cristo ou aprenderam das sugestões do Espírito Santo, nos ensina o Catecismo (CIC, 76).
Ensina-nos a importantíssima Constituição Dogmática Dei Verbum, do Concílio Vaticano II, que: "Para que o Evangelho sempre se conservasse inalterado e vivo na Igreja, os apóstolos deixaram como sucessores os bispos, a eles transmitindo o seu próprio encargo de Magistério" (DV, 7).
Vemos que os Apóstolos deixaram como seus sucessores os bispos, para que estes transmitissem aos seus sucessores o depósito da fé que eles tinham recebido de Jesus.
Sabemos que São Paulo instituiu muitos bispos; por exemplo, colocou Timóteo como bispo à frente da importante igreja de Éfeso; enviou Tito para a ilha de Chipre. É comovente a despedida que Paulo faz aos bispos de Éfeso, quando em caminho para o cativeiro de Roma: "Cuidai de vós mesmos e de todo o rebanho sobre o qual o Espírito Santo vos constituiu bispos, para pastorear a Igreja de Deus, que ele adquiriu com o seu próprio sangue. Sei que depois de minha partida se introduzirão entre vós lobos cruéis, que não pouparão o rebanho. Mesmo dentre vós surgirão homens que irão proferir doutrinas perversas, com o intento de arrebatarem após si os discípulos. Vigiai!" (At 20,28´31).
Vemos nesta passagem a preocupação do Apóstolo, recomendando aos bispos, "constituídos pelo Espírito Santo", que cuidem e vigiem o rebanho de Deus afim de que os hereges não lhe faça mal. O mesmo tipo de recomendação Paulo faz a Timóteo e a Tito: "Torno a lembrar-te a recomendação que te dei, quando parti para a Macedônia: devias permanecer em Éfeso para impedir que certas pessoas andassem a ensinar doutrinas extravagantes" (1Tm 1,3). "Recomenda esta doutrina aos irmãos, e serás bom ministro de Jesus Cristo, alimentado com as palavras da fé e da sã doutrina que até agora seguiste com exatidão" (1Tm 4,6). "Toma por modelo os ensinamentos salutares que recebeste de mim sobre a fé e amor a Jesus Cristo. Guarda o precioso depósito pela virtude do Espírito Santo" (2Tm 1,13´14). "Seja (...) firmemente apegado à doutrina da fé tal como foi ensinada, para poder exortar segundo a sã doutrina".
Nos ensina a Dei Verbum que: "Assim a pregação apostólica, expressa de modo especial nos livros inspirados, devia conservar-se sem interrupção até a consumação dos tempos. Por isso os Apóstolos, transmitiram aquilo que eles próprios receberam (cf. I Cor 11,23; 15,3), exortam os fiéis a manter as tradições que aprenderam seja oralmente, seja por carta (cf. II Tess 2,15) e a combater pela fé uma vez transmitida aos santos (cf. Jd 3). Quanto à Tradição recebida dos Apóstolos ela compreende todas aquelas coisas que contribuem para santamente conduzir a vida e fazer crescer a fé do povo de Deus, e assim a Igreja, em sua doutrina, vida e culto, perpetua e transmite a todas as gerações tudo o que ela é, tudo o que crê" (DV,8).
O nosso Catecismo explica assim:
"Esta transmissão viva, realizada no Espírito Santo, é chamada de Tradição enquanto distinta da Sagrada Escritura, embora intimamente ligada a ela. Através da Tradição, a Igreja, em sua doutrina, vida e culto, perpetua e transmite a todas as gerações tudo o que ela é, tudo o que crê (DV, 8)" (CIC n.78). "A Tradição da qual aqui falamos é a que vem dos Apóstolos e transmite o que estes receberam do ensinamento e dos exemplo de Jesus e o que receberam através do Espírito Santo.Com efeito, a primeira geração de cristãos ainda não dispunha de um Novo Testamento escrito, e o próprio Novo Testamento atesta o processo da Tradição viva" (CIC n.83).
A Dei Verbum, ensina que:
"Os ensinamentos dos Santos Padres [sec. I a VIII] testemunham a presença vivificante desta Tradição cujas riquezas se transfundem na praxe e na vida da Igreja crente e orante" (DV,8). "Embora a Igreja tenha ciência de que já não há que esperar nenhuma nova revelação pública antes da gloriosa manifestação de Nosso Senhor Jesus Cristo" (DV,4), no entanto, o Catecismo nos assegura que "embora a Revelação esteja terminada, não está explicitada por completo; caberá à fé cristã captar gradualmente todo o seu alcance ao longo dos séculos" (CIC, 66).
E isso o Espírito Santo continua a fazer na Igreja através dos teólogos e do Magistério oficial. Aos teólogos cabe aprofundar os conhecimentos do mistério da fé, guiados pelos dogmas já revelados; mas somente ao Magistério cabe definir as verdades da fé.
A Tradição e a Bíblia estão intimamente ligadas. Tanto uma como a outra tornam presente e fecundo na Igreja o mistério de Cristo, presente na Igreja até o fim do mundo (cf Mt 28,20). Ensina-nos a Dei Verbum que: "A Sagrada Tradição e a Sagrada Escritura estão, portanto, estreitamente conexas e interpenetradas. Ambas promanam da mesma fonte divina, formam de certo modo um só todo e tendem para o mesmo fim. Com efeito a Sagrada Escritura é a fala de Deus, enquanto é redigida sob a moção do Espírito Santo; a Sagrada Tradição, por sua vez, transmite integralmente aos sucessores dos Apóstolos a palavra de Deus confiada por Cristo Senhor e pelo Espírito Santo aos apóstolos para que, sob a luz do Espírito e da verdade, eles por sua pregação fielmente a conservem, exponham e difundam. Resulta, assim, que não é através da Escritura apenas que a Igreja consegue sua certeza a respeito de tudo o que foi revelado. Por isso, ambas - Escritura e Tradição - devem ser aceitas e veneradas com igual sentimento de piedade e reverência" (DV,9) (CIC, 82).
Muitas são as passagens do Novo Testamento que revelam a importância da Tradição oral. São Paulo diz a Timóteo: "O que ouvistes de mim em presença de muitas testemunhas, confia-o a homens fiéis, que sejam capazes de ensinar ainda a outros" (2 Tm 2,2). Note bem o "ouvistes" de mim. É a transmissão oral do depósito da fé. Vemos aí a própria Escritura atestando a existência da transmissão oral, de geração a geração.
Este "depósito" oral chegou até nós pela palavra oficial da Igreja, e não pode ser desprezada. Jesus deixou claro a seus discípulos, na noite da despedida, que Ele não lhes tinha ensinado tudo, mas que o Espírito Santo o faria ao longo do tempo: "Muitas coisas tenho a dizer-vos, mas não as podeis suportar agora. Quando vier o Advogado, o Espírito da Verdade, ensinar-vos-á toda a verdade...´ (Jo 16,12).
Todo esse ensinamento que o Espírito Santo foi acrescentando à Igreja é o que foi formando a sua Sagrada Tradição. Era tão marcante a inspiração do Espírito Santo que, por exemplo, após o Concílio de Jerusalém, os apóstolos escreveram à Igreja de Antioquia: "Com efeito, pareceu bem ao Espírito Santo e a nós..." (At 15,28). Outras passagens mostram essa intimidade deles com o Espírito Santo. "Então Pedro, cheio do Espírito Santo..." (At 4,8). "Por que combinastes para por à prova o Espírito do Senhor ?" (At 5,9). Diante do Grande Conselho dos Judeus e do Sumo Sacerdote: "Deste fato nós somos testemunhas, nós e o Espírito Santo..." (At 5,32).
Podemos, portanto, afirmar, com toda certeza, que tudo o que está na Bíblia é verdade, mas nem toda a verdade está na Bíblia. Parte da Revelação foi oral e está na Tradição, que, por isso é Sagrada e indispensável. Na segunda Carta aos tessalonicenses vemos claramente a Tradição oral: "Não vos lembrais de que vos dizia estas coisas, quando estava ainda convosco? " (2Tes 2,5). "Assim, pois, irmãos, ficai firmes e conservai os ensinamentos que de nós aprendestes, seja por palavras, seja por carta nossa" (2Tes 2,15). "O que ouvistes de mim em presença de muitas testemunhas, confia´o a homens fiéis, que sejam capazes de ensinar ainda a outros" (2 Tm 2,2).
Essas passagens se referem a uma transmissão de verdades por meio oral e não escrito. Como, então, desprezar o seu valor? Nem tudo o que Jesus ensinou e fez, e nem tudo o que os apóstolos ensinaram, foi escrito. Naquele tempo era difícil escrever. Não havia papel e caneta fácil como hoje. Usava´se pergaminhos (peles de carneiros), papiros, etc., penas molhadas na tinta. Escrever era raridade. São João encerra o seu Evangelho mostrando claramente isto: "Jesus fez, diante dos seus discípulos, muitos outros sinais ainda, que não se acham escritos neste livro. Estes, porém, foram escritos para crerdes que Jesus é o Cristo, o Filho de Deus, e para que crendo, tenhais a vida em seu nome" (Jo 20,30s).
Mais adiante ele repete:
"Há muitas outras coisas que Jesus fez e que, se fossem escritas uma por uma, creio que o mundo não poderia conter os livros que se escreveriam" (Jo 21,25). Essas passagens deixam claro que os evangelistas e Apóstolos só escreveram o essencial da mensagem de Cristo, "para crerdes que Jesus é o Cristo, o Filho de Deus, e para que crendo, tenhais a vida em seu nome".
Vemos assim que a própria Bíblia nos encaminha para as fontes orais da Palavra de Deus; isto é a Tradição oral que a berçou. Não podemos jamais nos esquecer de que a Igreja é anterior ao Novo Testamento e que foi ela que formou o cânon do Antigo Testamento como o temos hoje. Logo, sem a Igreja a Bíblia se esfacela. O Cristianismo já existia quando foi escrito o Novo Testamento: "os fiéis eram assíduos aos ensinamentos (orais) dos apóstolos" (At 2,4). Portanto, é a Igreja que credencia a Bíblia. Foi a Igreja que "constituiu" a Bíblia, como a temos, e não o contrário. Todo este ensinamento é reafirmado pelo último Concílio, quando diz na Dei Verbum: "Assim a pregação apostólica, expressa de modo especial nos livros inspirados, devia conservar-se sem interrupção até a consumação dos tempos. Por isso os Apóstolos, transmitiram aquilo que eles próprios receberam (cf. I Cor 11,23; 15,3), exortam os fiéis a manter as tradições que aprenderam seja oralmente, seja por carta (cf. II Tess 2,15) e a combater pela fé uma vez transmitida aos santos" (cf. Jd 3).
Infelizmente os reformadores protestantes tomaram a Bíblia como "a única fonte de fé" e, pior ainda, entendida segundo o 'livre exame" de cada crente, podendo interpretá-la segundo o seu parecer, 'guiado pelo Espírito Santo'. Negaram a Tradição oral, repudiaram o Magistério, abandonaram a Igreja, esquecendo-se que Ela é anterior à Bíblia (Novo Testamento).
(...)
O Catecismo da Igreja fala também da importância da Tradição. Logo no ínicio da sua apresentação, o Papa João Paulo II diz: "Guardar o depósito da fé é a missão que o Senhor confiou à Sua Igreja e que ela cumpre em todos os tempos" (FD, introdução). Com essas palavras o Papa nos ensina que a missão por excelência da Igreja é guardar intacta a mensagem que recebeu de Jesus, e que salva a humanidade. O Catecismo ensina que a Tradição consiste em tudo aquilo "que vem dos apóstolos e transmite o que estes receberam do ensinamento e do exemplo de Jesus e o que receberam através do Espírito Santo" (CIC, 83).
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http://www.cleofas.com.br/virtual/texto.php?doc=IGREJA&id=igr0527
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