Em 1436, num lance de pura sorte, descobriu-se em Constantinopla (Turquia), um manuscrito, em grego, uma espécie de coletânea dos escritos mais importantes dos primeiros cristãos.
Um deles, uma carta de autor anônimo do final do segundo século, responde a algumas questões sobre a religião dos cristãos, a um personagem real que viveu no ano de 197 e era administrador romano: Cláudio Diogneto.
Diogneto ouvira dizer que eles seriam um “povo novo”, portador de uma “nova civilização”, e pedia informações sobre isto.
O autor da carta não faz outra coisa que confirmar essa função do cristianismo.
Vamos à leitura dessa carta.
“Os cristãos - diz uma passagem da obra - não se distinguem dos outros homens pelo lugar de origem, pela língua que falam, ou pelo modo de vestir. Não moram em cidades próprias, não se comunicam com uma linguagem incompreensível para os outros homens. Numa palavra, quem os vê não percebe neles nada de especial. A doutrina que praticam não nasceu da imaginação ou da fantasia de algum cérebro privilegiado, nem se julgam - como muitos fazem - representantes imbatíveis de alguma doutrina humana. Podem ser encontrados entre os gregos e entre os bárbaros. Vivem segundo os costumes do lugar...
Entretanto, é possível notar que as suas comunidades são regidas por leis extraordinárias, que poderiam até parecer paradoxais, mas habitam nela com se fossem estrangeiros, com residência provisória. Cumprem rigorosamente os próprios deveres de cidadãos e, se têm algum ofício, executam com responsabilidade, porém como se isso não lhes importasse pessoalmente. Em qualquer país estrangeiro sentem-se como se estivessem em casa, mas também é verdade que para eles qualquer pátria é uma terra estrangeira. Eles se casam, como todos os outros, e têm filhos, mas nunca abandonam os recém-nascidos.
Compartilham a mesma mesa, porém não o mesmo leito. Para abreviar, eles também são feitos de carne, mas não vivem segundo a carne.
Passam a vida sobre a terra, mas são cidadãos do céu. Obedecem às leis vigentes, mas a conduta deles, quanto à perfeição, supera as leis. Amam a todos e por todos são perseguidos, desprezados, condenados; para eles, morrer é nascer para a vida. São pobres, mas enriquecem os outros. Falta-lhes tudo, mas é como se vivessem na abundância.
Alguém os despreza? É como se os elogiasse. Quando caluniados, sentem-se compreendidos. Se os insultam, eles bendizem, se os ultrajam, eles agradecem. São pessoas que só fazem o bem, mas são punidas como criminosas. Quando lhes batem, eles exultam de alegria, como se recebessem uma vida nova.
Os judeus fazem guerra contra eles e os gregos não ficam atrás em persegui-los, porque ninguém os considera como membros da mesma “raça”. Entretanto, todos os que os odeiam não saberiam dizer o motivo do próprio ódio.
Numa palavra: diante do mundo os cristãos exercem a mesma função que a alma no corpo humano: como a alma está presente em todos os membros do corpo, assim também os cristãos estão em todas as cidades da terra. A alma, que não se vê, está como que presa num corpo visível. Assim também são os cristãos: estão presentes no mundo, sem dúvida, mas é invisível o culto que prestam a Deus."
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